domingo, 26 de maio de 2013

Terror


Jurei solenemente que iria deixar você tão pra trás que nem em minhas memórias eu iria te encontrar. E, por um momento, eu pude acreditar nessa incerteza como algo próprio do meu ser e do nosso pequeno jogo de romance. Era tudo uma questão de tempo até eu ouvir o primeiro estrago que sua partida me fez. E depois de ouvir, seguir o viver da vida sem ao menos senti-la como deveria sentir. Sempre naquele gosto de amargo na língua, queimando todas as entranhas como uma coisa negra e consumidora, como uma dor tão leve e tão passageira que durasse minha vida inteira, pois, afinal, minhas memórias frágeis e voláteis me diziam que nunca teve um "antes" antes de você. Eu jurei solenemente pela minha própria fé de dias melhores, pela minha própria fé na minha capacidade de seguir adiante, mas o quão complicado é continuar andando quando uma parte sua caminha através de fragilidades, coisas frágeis, como seu coração, como meu coração? Só mais um juramento, uma promessa, não comprido. Vestígios de uma honestidade simples e falha. E por mais que pareça um sofrimento de amor, eu já não posso dizer que é amor. Talvez seja apenas medo de seguir em frente sem você, acabar com todos os planos que havíamos feito pro futuro e aguentar mais um tanto de tempo aqui, na minha própria cabeça, na minha solidão de pensamentos passageiros e enferrujados. Aquele gosto de amargo que me acompanha toda a vez que respiro. Isso talvez não seja amor. Isso talvez não seja paixão. Talvez nem seja solidão, tristeza ou arrependimento. Talvez seja apenas medo de viver sem você.

quinta-feira, 16 de maio de 2013

Almaços


Ele havia entrado na padaria para comprar um maço de cigarros, mesmo sabendo que ela não vendia e que nem tinha dinheiro para comprá-lo.
 - Por favor - disse ele para a vendedora do balcão, - um maço de cigarros.
 - Senhor, não vendemos cigarros - respondeu a mulher atrás do balcão.
 - Mesmo assim, eu gostaria de comprar um maço de cigarros.
 - Isso é uma padaria, não vendemos cigarros.
 - Vendem sim que eu sei. Vamos, por quanto você me venderia?
 - Senhor - suspirou a mulher, - não temos cigarros aqui. Compreende?
 - Não?
 - De maneira alguma.
 - Que absurdo! Todos os lugares deveriam ter cigarros.
 - E por que você diz isso?
Ele olhou para trás, em direção a rua, colocou as duas mãos no bolso e tirou um papel amassado de um deles.
 - Por favor - disse ele. - Leia o que está escrito nesse papel.
A mulher pegou o papel, com receio, desamassou-o o suficiente para conseguir entender o que estava escrito e portou-se a dizer em voz alta:
 - “Aqui, na rua, eu vi uma delicada mulher, linda como o brilho de uma lua cheia, andar. Eu, estonteado pela beleza singular e rara dela, a persegui como um sonho de verão. Ela nunca olhou para mim, mas eu sempre tive a oportunidade de vê-la, de ver aqueles olhos de cor azul como o céu e com tantos pecados quanto possíveis. A persegui por 26 dias, contando os domingos, até o dia que me atrevi a lhe falar. Ela possuía uma voz de seda, delicada e suave, pronta para esmagar meu coração com veludo. Ela retirou um cigarro de sua bolsa, o acendeu vagarosamente e me ofereceu um. Aceitei sem pensar duas vezes, embora eu não fumasse. Ela me disse que todos deveriam fumar. Perguntei para ela, por que, e só o que eu vi foram os dois olhos dela virando para mim, com um ar angelical, e o som de uma risada leve, de outro mundo. Ela respondeu com a seguintes palavras: “Quando o amor não serve de vício, porque mata e esmaga, o cigarro é um excelente apaziguador de corações”. Perguntei-lhe, “por que então não a bebida?”, e ela me respondeu “bebida? Ela vícia, e mata, e te faz perder o sentidos.” - a mulher deu uma pausa, olhou para ele, que fez sinal para continuar - E ela continuou: “deveria haver cigarros em todos os lugares”. Novamente, lhe perguntei “por quê?”. Sua resposta, que nunca esquecerei: “Quando a vida dá uma trégua, é hora de fumar. É hora de matar a dor, de esquecer a dor. O mundo precisa de cigarros. O mundo precisa de amor.”
 - Ótima leitura - disse ele. - Pode parar aí mesmo. Deixe-me te perguntar, você fuma?
 A mulher, esbabacada pelo o que havia lido, demorou a responder.
 - Sim. 
 - Você ama?
 - Sim.
 - Com que frequência?
 - Como assim?
 - Quando você se toca que está amando?
 - Eu.. não sei.
 - Entendo. Então, você tem cigarros, não é?
 - Tenho?
 - Poderia me dar um?
 - Claro.
A mulher se afastou, pegou um cigarro e deu-o para ele.
 - Muito obrigado.
 - Sabe, você poderia ter ido na loja do lado, lá eles vendem maços de cigarro.
 - Eu sei. É que eu não tinha dinheiro e precisava amar um pouco.