domingo, 29 de novembro de 2015

Assim são



Tenho uma má mania de me apaixonar pelas pessoas erradas.
Elas surgem do nada
Doando nada além de alguma coisa que possa ter valor no futuro.
Geralmente não há valor.
É apenas uma chance.
E ela desce o ralo das lamentações enquanto penso:
"que merda".

Mas quando a chance é conquistada
(Ou eu sou conquistado pelas promessas da chance)
Percebo que o placar já começou negativo
Já estou perdendo o jogo muito antes de entrá-lo
Fico na esperança da mudança da maré
Esperando uma onda de sorte bater na praia
E acabo ficando sentado na mesma praia pensando
Em todos os lugares
Os outros lugares que eu poderia estar.

E não consigo me despedir do imaginário
Que povoa todos os cantos da minha mente
A qualquer lugar que eu vá
Qualquer porta que eu abrir
Qualquer janela com o intuito de ventilar
O coração
Lá estará a esperança da chance
A esperança
Aquele caminhar no escuro sem saber exatamente por onde anda
Esperando que tropece em alguma coisa
Que dê certo em sua vida.

E a chance que vejo é sempre errada.
Sempre me apaixono pela pessoa errada.
Todo amor que sinto é errado.
Parece oco de um lado e um naufrágio do outro:
de um lado há um sentimento diferente;
do outro um fim de mundo a cada segundo de existência
Um eco infinito que lembra mais uma tormenta
Do que algum conselho de boa sabedoria

Só sinto a dor de sentir quando já é tarde
E a chance já me enganou
Sinto que posso ter aquela alguma coisa importante de você
Sinto que posso ser mais do que eu sou se eu estiver com você
Estou perdido em você
Não há mais volta a não ser cair sem freios
E lá vem mais uma nova onda
Um tsunami
E o barco, navio, que comando
Despenca no oceano como um pedaço de tristeza
Flutuando ligeiramente, pedindo socorro
E depois só caindo em direção ao mortiço, infinito amor

Só me apaixono pelas pessoas erradas.
E me parece
que todas
assim
são.

domingo, 8 de novembro de 2015

Fui

Os poemas se foram, assim como os amores
Indiciados por serem vulgarmente recomendados
Trechos heroicos de uma vida decepcionante
Os poemas se foram e lá se vão os amantes
Ora sim, ora não, contrabandeio um pouco de emoção
E lembro que até minha alma pediu perdão
Enquanto seguia pela saída de emergência do prédio
Os poemas se foram, os amores se foram, eu fui
Já fui melhor, já tive mais amor, já fui alguém maior
Seguia métricas decassílabas, clássicas como são
Sonetos apaixonantes seguindo a tradição
Tive amores incontáveis e a eles escrevi poemas milhares
Mas os poemas já se foram
Os amores já se foram
Os trechos de minha vida já se foram
Fui mas não tive sorte em ser e ter
Fui embora pela entrada e dancei uma meia volta
Atalhado pelo insucesso da vida e do coração
Os poemas se foram, assim como os amores
Foram belos enquanto duraram e se foram
Fui-me e voltei-me pro prédio que chamo de prisão e corpo
Observei seu estado decadente e vencido
Compreendi as ausências sentidas em seu interior
E voltei-me com outra visão, outra razão, outro coração
Sofri em meu silêncio perturbador e adentrei nova mente
Impuro mas a par de meus impares
Fui-me e voltei-me
E logo após voltaram
Os poemas voltaram assim como os amores
E fui.

domingo, 25 de outubro de 2015

Vento



Já não tenho certeza de seu amor, que, assim como vento, parece abalar as estruturas de meu eu e sumir com o raiar do sol do dia. Gostaria de te dizer palavras de amor mais sinceras do que as que digo em nosso conversar, em nossas trocas diárias de exclamações sobre as efemeridades da vida. Busco em palavras irrelevantes o sentimento que tentamos passar com nossas frases de paixão adolescente, garantindo em abraços nem sempre tácteis algo muito maior do que deixamos transparecer. E então chega o frio da noite urbana e nossos corações parecem congelar com a temperatura e com o medo de transparecermos demais com as luzes fictícias, uma ironia da vida, onde podemos ser quem somos no calor do dia e nos ausentar no medo da noite, onde nos sentimos mais sozinhos e desesperados. A noite escura cheia de desamores. Deito em meu travesseiro e busco respostas no teto branco, esperando que ele me alerte com palavras o que será de meu desatinado e perdido coração quando a escuridão chegar e as mentiras e omissões ilusórias começarem a preencher o vazio de tantos sumiços. Eu sei, não é assim, mas finjo e tento rir de minha inocência, de minha incompreensão, do vasto campo imaginário que possuo e não uso com tanta frequência quando gostaria (as palavras são mais caras do que gostaria que fossem, não posso me livrar delas e nem de seus preços e apreços em minha vida mortal). Palavras são o que eu tenho e gostaria de ouvi-las de você, gostaria de senti-las em você, nos lábios do seu peito metafórico, no amar sincero que podemos sonhar. Assim como o vento, você tende a aparecer e ir embora sozinha, e eu, como o dente de leão, só aguento o que pode levar meus sonhos adiante enquanto minhas raízes suportam o peso bruto que é amar. Seria você capaz de ser esse vento e ventar sempre, todo dia e noite, e me (e)levar onde nunca pensei em ir. Você é o meu vento incerto e aleatório e espero com a paciência de uma flor na noite fria e parada que você me abrace e me dê um olá.

domingo, 24 de maio de 2015

Quebrei-me




Silêncio, como um câncer, cresce

Já faz um tempo desde minha última confissão, caro leitor. Ando pensando em grande margens brancas de nada, onde as palavras chegam de carona, mas lembram que esqueceram alguma coisa em casa e logo voltam para o lugar mágico de onde vieram. Tento ligar para elas, mas elas não atendem minhas ligações e, quando atendem, ficamos alguns minutos conversando sobre a vida: elas me esclarecem como as coisas vão e me dizem que uma hora, qualquer hora, elas aparecem. Já faz um tempo desde a última aparição delas também.

Sinto-me desleixado ao acreditar que depois de tanto tempo no ofício de deixar as emoções extravasarem-se por conta própria, eu não consiga escrever uma coisa que não seja uma mentira ou uma quantidade enorme de merda. Se eu conseguisse escrever por completo, é claro. No começo eram apenas umas linhas aqui, umas linhas lá, nada que eu não pudesse alimentar com a dor de uma boa trilha sonora retalhadora. Com o passar da vida, o ato foi se tornando mais mecânico do que prazeroso: eu não me expunha com medo do que você, caro leitor, fosse pensar de mim. Ainda mais considerando as coisas tão dolorosas que andam navegando pelas águas de minha mente. 

Mas aqui estou eu fazendo minha confissão de fracasso pessoal. Não passa um dia sem que eu pense em sentar em minha cadeira já velha, gasta pelo botões dos meus jeans, abrir qualquer editor de texto e simplesmente escrever, deixar rolar. Um ato que não só era prazeroso, mas também auto suficiente, se tornou robusto, difícil demais de carregar. Culpo meu medo das coisas que poderiam achar de mim se dissesse meus pensamentos claros, nem sempre objetivos (uma coisa que aprendi com o passar do tempo é que toda a verdade pode ser colocada em roupas bonitas e ser mostrada ao público sem que ele a entenda de verdade: acharão que é uma mentira, obra de ficção da mente desgovernada de seu autor, e que assim pensem). Sempre me importei com que você, caro leitor, fosse pensar se eu chegasse com um excelentíssimo filho da puta de palavrão logo na primeira linha. Sempre tive medo de dizer como me sentia sobre alguém específico num texto, mesmo que eu vestisse todas as palavras que meu coração quisesse dizer em roupas subjetivas - não conto a verdade se não você não quiser olhá-la, querida.

E pergunto-me agora se foi apenas esse medo de dizer algumas coisas que fui cavando e guardando no meu coração que me impediu de escrever por tanto tempo sobre qualquer coisa que fosse. Preferia escrever sobre efemeridades do que não escrever por completo. Uma parte de mim diz que passo muito tempo no twitter falando sobre as coisas que gostaria de escrever sobre. Outra diz que qualquer coisa que eu diga não faz sentido porque já não sou o mesmo cara sentimental que alimentou um blog com tanta dor e amor que teve que matá-lo. Tem a parte que diz que tenho medo do que o caro leitor poderia pensar e tem uma outra que acredito muito mais: eu tenho medo de escrever e perceber que nunca fora bom no ofício. 

Era só o que faltava: jovem escritor, cujos trabalhos nunca alcançaram um livro impresso (na verdade, há um poema meu que ganhou menção honrosa num certo concurso de escrita aqui da cidade - o poema acabou chegando a coletânea de textos que fizeram, mas isso é irrelevante), sente que não pode mais escrever porque acha que sua vida está uma desgraça. Seu coração está partido há muito tempo e, apesar dos esforços, eles só se afoga mais nas águas turvas da memória e da solidão. Sua mente anda dilacerada por conta das escolhas que teve que fazer, de todos os eus que teve que matar para sobreviver mais um dia nessa sociedade horrenda e cultivadora de imagens que vivemos. 

Esse jovem autor - olá - se sente inferiorizado. Não, essa não é a expressão correta. Autodepreciado. Sim, se encaixa muito mais. Quebrei-me em mil pedaços com o passar desses últimos anos e não sei quantos deles ainda podem ser achados. Achei um para escrever esse texto. São quase uma da manhã, tenho que trabalhar amanhã. Terei que colocar aquele sorriso falso e conivente senão acharão que há algo errado comigo. "Existe algo errado com você, caro escritor?", o caro leitor, talvez você, possa perguntar. Lógico que tem alguma coisa de errado comigo. Você está lendo este texto, já deve ter percebido.

Gostaria de ter algo sincero ou mais completo para dizer sobre tudo isso, porém me parece que grande parte das minha ferramentas foram tiradas de minhas posses. É provável que estejam enferrujando em algum oceano, junto com meus antigos navios e meus antigos companheiros de viagem. Pode ser que alguém esteja as usando para sangrar meu interior, matar-me aos poucos. Quem sabe, esse alguém não seja eu mesmo.

Quebrei-me em mil pedaços, caro leitor. Pretendo fazer algo sobre isso. E logo.